28 Novembro 2022
O sociólogo e economista estadunidense analisa a crise atual e a transição para um novo tempo em A era da resiliência.
A entrevista é de Justo Barranco, publicada por La Vanguardia, 23-11-2022. A tradução é do Cepat.
Seus livros, de O fim dos empregos a The empathic civilization, de Sociedade com custo marginal zero a The Global Green New Deal, foram dando forma ao futuro durante décadas quase tanto quanto seu trabalho como consultor da China, da União Europeia e dos Estados Unidos para estabelecer planos para uma Terceira Revolução Industrial capaz de enfrentar as mudanças climáticas.
Agora Jeremy Rifkin (Denver, 1945) publica La era de la resiliencia (Paidós), um roteiro para uma nova era em que a palavra-chave da era moderna, eficiência, dá lugar àquela que sempre presidiu a vida humana, adaptabilidade. Entramos, diz ele, na era da resiliência, na qual precisamos entender não só que fazemos parte do ecossistema, mas que cada um de nós é um ecossistema. E que não devemos apenas construir novas infraestruturas de energia, de comunicação e de mobilidade, mas também mudar o manual de instruções.
Crises econômicas, pandemias, guerras: em que momento estamos?
Houve uma mudança básica na consciência como espécie nos últimos 24 meses. Provavelmente a maior da história. Começamos a perceber que este planeta é muito mais poderoso do que pensávamos e que não precisa de nós. Vamos passar de 1,5ºC, que era a linha vermelha, e podemos chegar a 2, 2,3 ou 2,5ºC. Os vírus estão migrando, são migrantes climáticos. Nossos ecossistemas estão entrando em colapso. A região com o mais grave problema de inabitabilidade é o Mediterrâneo. Estamos imersos na sexta extinção. E há um mal-entendido sobre como chegamos aqui; os combustíveis fósseis não são os únicos responsáveis.
Do que se trata?
Judeus, cristãos e muçulmanos fazem parte da tradição abraâmica, e no Gênesis Deus expulsou Eva e Adão do paraíso, mas deu a Adão “domínio sobre todas as espécies da Terra, sobre todas as criaturas vivas do planeta”. Esse mandato permaneceu conosco. A era do progresso, nos últimos dois séculos, é uma combinação dessa ideia. E a visão de mundo e a política da era do progresso nos levaram à extinção. Para os hominídeos, nossa orientação temporal era a adaptabilidade até que a última era glacial chegou ao fim, há 10.000 anos.
Chegou a era do clima estável. O Holoceno. Nos assentamos. Criamos a agricultura, a pastorícia, as grandes civilizações hidráulicas, a revolução industrial. Adaptamos a natureza a nós e isso culminou na eficiência, que é extrair grandes valores da água, do solo e da biosfera, em maior velocidade e em menor intervalo para consumi-los. E depois nos perguntamos por que exaurimos o planeta! A era do progresso está morta. A era da resiliência já está aí.
O que devemos fazer na era da resiliência?
Entramos na era da infraestrutura da terceira revolução industrial, da internet da comunicação e da energia: milhões já geram sua energia solar e eólica e compartilham o excedente. Ambas convergem com a internet da logística e da mobilidade, o transporte elétrico e com a célula de combustível. E tudo interligado com a internet das coisas. O parque habitacional será inteligente com sensores. Uma revolução que unirá o planeta como um grande cérebro digital. Estas são as possibilidades que nos são oferecidas.
Chegar aí é um grande problema por causa dos velhos interesses, da indústria dos combustíveis fósseis e dos políticos relutantes em mudar. Mas o mercado está aí: a solar e a eólica já são de longe as energias mais baratas. A tecnologia existe. E o dinheiro espera: os investidores retiraram bilhões da indústria de combustíveis fósseis e só encontram pequenos projetos-piloto. Falta vontade política.
Mas já estamos passando do capital financeiro para o ecológico, da produtividade para a regeneratividade, dos direitos de propriedade intelectual para o código aberto e da globalização para a glocalização, porque os custos fixos da revolução digital estão diminuindo e você pode interagir com uma pessoa do outro lado do planeta.
Qual a probabilidade de realmente mudarmos?
Somos uma espécie que vive através de suas próprias histórias. E essas histórias nos permitem começar a desenvolver as novas infraestruturas. Somos, talvez, a espécie mais adaptável, com exceção das bactérias e dos vírus. Usemos esses circuitos neurais empáticos para nos readaptarmos à natureza. Temos enormes exércitos por causa da era industrial dos combustíveis fósseis, para assegurá-los. E o urânio. Milhões morreram por eles. A última guerra é a da Ucrânia e da Rússia.
Chegou a era da empatia?
As grandes religiões axiais surgiram ao mesmo tempo que as grandes civilizações hidráulicas, que reuniram muitas pessoas que se guiavam pelo tribal e se viram escravizadas para construir diques, celeiros e estradas. Elas não tinham identidade. Essas religiões se tornaram a figura paterna com a qual simpatizar e pela qual morrer.
Hoje, os jovens levantam a cabeça e surge uma nova filiação: a consciência da biofilia. Reconhecem-se como uma espécie em extinção, sem maiores linhas divisórias, consideram o planeta como seu lar, e seus semelhantes como sua família. E os outros estão aí dizendo “não, não” porque veem sua identidade ameaçada e não são o futuro, mas ainda têm muito poder.
A razão pela qual penso que há esperança é que, em todos os desastres climáticos, as pessoas vêm em socorro de outras. Até certo ponto, a mudança climática está nos aproximando pela empatia.
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“A era do progresso acabou e a da resiliência já está aí”. Entrevista com Jeremy Rifkin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU